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Coluna sobre Direito: REFLEXOS DA UNIÃO ESTÁVEL NA SUCESSÃO E NA HERANÇA

  • 07/02
  • Geral
  • Jornalismo

A coluna desta sexta-feira (6) vem para explicar sobre um assunto que foi polêmica nesta semana, confira a opiniões dos nossos colunistas:

 

REFLEXOS DA UNIÃO ESTÁVEL NA SUCESSÃO E NA HERANÇA

 

Em tempos de acalorada discussão sobre a união estável e seus reflexos na sucessão e no direito de herança, a exemplo do caso envolvendo o famoso apresentador “Gugu Liberato”, cabe a reflexão quanto aos requisitos necessários para caracterizar esse tipo de convivência.

 

Para quem está alheio ao caso referido, o apresentador, vítima fatal de um acidente doméstico e dono de uma fortuna bilionária, ao elaborar o testamento, exclui totalmente a “mãe de seus três filhos”, sob a perspectiva de que inexistia união estável, conforme afirmado pelo advogado da família Liberato, em rede nacional.

 

Muito embora se utilize do atual e famoso caso envolvendo a família Liberato, o qual não se pretende resolver por meio desse modesto texto, ante a falta de elementos concretos, é comum essa discussão no dia a dia das pessoas, especialmente na rotina dos advogados militantes no direito de família. Eis então que surge o questionamento: o que é necessário para caracterizar a união estável? Quais os reflexos na esfera patrimonial e no direito de herança. Pois bem, a Constituição Federal, no §3° do artigo 226, estabelece que “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

 

O artigo 1.723 do Código Civil, por sua vez, preceitua que “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.” Ressalta-se, neste ponto, o entendimento do Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento da ADI n° 4.277 e da ADPF n° 132, onde resta reconhecida também a união homoafetiva.

 

Um dos aspectos principais para configuração da união estável, salvo melhor interpretação, parece estar no objetivo de constituição de família, a qual, nos termos da Carta Magna, é base da sociedade e goza de especial proteção do Estado.

 

A legislação acrescentou, ainda, como requisitos mínimos, por assim dizer, a continuidade e durabilidade da relação, a fim de comprovar que a união está estabilizada, aliados à publicidade, ou seja, se aquela convivência, aos olhos do meio social em que se vive, é vista na condição de se casados fossem.

 

Com tais parâmetros a legislação aponta o caminho a ser observado para caracterização ou não da união estável, sendo de extrema importância a análise das particularidades de cada caso concreto.

 

Uma vez reconhecida a união estável, necessário se faz a regulamentação do regime de bens a ser adotado, pois é natural que o casal, com o passar do tempo, adquira bens, os quais sofrerão reflexos com o fim da união ou com a morte de um dos conviventes.

 

Surge então o artigo 1.725 do Código Civil, o qual dispõe que “na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.”

 

Comumente, a grande maioria das uniões estáveis não possui contrato escrito entre as partes, prevalecendo o regime da comunhão parcial de bens, onde comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções do artigo 1.659 e seguintes do CC.

 

Como consequência da regra, em caso de dissolução da união estável (“separação”), serão partilhados os bens adquiridos onerosamente e com mútuo esforço durante a constância da união, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada uma das partes.

 

O assunto torna-se um pouco mais complexo quando um dos conviventes vem a falecer. Nesse caso, tem-se que observar, se o cônjuge sobrevivente participa ou não da sucessão, em outras palavras, se tem direito ou não à herança.

 

Para tanto, o artigo 1.829 do Código Civil estabelece que “a sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se (...), no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;”

 

Tomando como exemplo o caso do apresentador acima mencionado, e observando sob a ótica de que a união estável reste reconhecida, terá que ser analisado se todos os bens deixados são comuns ao casal, ou seja, se todos foram adquiridos onerosamente e com mútuo esforço após início da convivência ou se existem bens particulares do falecido, os quais, via de regra, são aqueles adquiridos antes do início da união estável por um dos conviventes.

 

Se todos os bens são comuns ao casal, a cônjuge sobrevivente já possui cinquenta por cento do patrimônio e não concorrerá (“herdará”) com os descentes (filhos) na outra metade dos bens deixados pelo falecido.

 

No entanto, se parte dos bens forem particulares, adquiridos exclusivamente pelo falecido (aparentemente o caso do exemplo acima) sobre esses bens a cônjuge sobrevivente não terá direito à meação, mas irá concorrer com os filhos na partilha, ressalvado sua metade daqueles bens comuns.

 

Como visto, os debates no direito de família, especialmente em decorrência das particularidades de cada caso, são sempre complexos, trazendo inúmeras dúvidas e incertezas para as partes envolvidas, o que acaba por gerar longos debates judiciais, situação essa que está a se desenhar no caso da “família Liberato”.

 

Ótimo final de semana a todos!

 

Sidclei José de Godois

OAB/PR 50.331

 

Ademir Gonçalves de Araújo

OAB/PR 54.449